Revista Salud y Bienestar

Alteração legislativa ao horário de abertura das farmácias: uma opinião fundamentada

Por Saludyotrascosasdecomer

Na passada 5ª feira, 2 de Setembro, o Governo Português aprovou em Conselho de Ministros, um Decreto-Lei que “regula a possibilidade de abertura de farmácias 24 horas por dia, todos os dias da semana”

A decisão surge aproximadamente uma semana depois de ter sido divulgado na imprensa que o INFARMED havia proibido uma farmácia de Lisboa de continuar aberta para além “dos limites máximos do horário de funcionamento previsto na legislação em vigor”. A decisão do INFARMED suscitou alguma polémica na medida em que a alteração do horário da farmácia havia sido comunicada ao regulador cerca de 6 meses antes da sua entrada em vigor, sem que qualquer objecção houvesse sido levantada. A alteração do horário da referida farmácia suscitou o protesto formal de outras farmácias da zona e da Associação Nacional de Farmácias mas contou com o apoio da Junta de freguesia local e da população, que subscreveu em grande número um abaixo-assinado entretanto enviado para o INFARMED.

Feito o (brevíssimo…) ponto da situação, e não sendo profundo conhecedor da legislação nesta área nem parte interessada, sou da opinião que a iniciativa do legislador é oportuna e adequada. Porquê? Em primeiro lugar, porque visa, nas palavras da própria ministra da saúde, “evitar situações confusas de interpretação da legislação”, clarificando assim o enquadramento legal no que concerne aos horários das farmácias. A legislação deve ser cumprida por todos por igual, mas, para tal, deve ser clara e não permitir “interpretações” distintas consoante os interesses individuais.

Em segundo lugar, porque reforça o estatuto da farmácia comunitária como espaço de saúde pública e não como mero estabelecimento comercial, algo que sempre defendi: segundo esta lógica, que tem implicações também a outros níveis, o objectivo primordial da farmácia deverá ser a prestação de um serviço fundamental à população, aumentando a acessibilidade ao sistema de saúde. Obviamente há e haverá um interesse económico subjacente, na medida em que esse serviço é financiado através das margens de lucro dos medicamentos, legalmente definidas (o que aliás, não ocorre em nenhum outro sector de actividade económica).

No caso concreto, existe um regime de turnos que visa assegurar que, seja qual for a hora do dia, um cidadão tem pelo menos uma farmácia disponível, à qual pode recorrer para satisfazer uma necessidade urgente na área da saúde. O regime de turnos visa assim assegurar um direito da população e aumentar a acessibilidade ao sistema de saúde. Na vasta maioria dos casos, e não obstante a cobrança (estabelecida legalmente) de taxas de urgência a quem usufrua destes serviços, a obrigatoriedade de manter uma farmácia aberta entre as 24 e as 6 horas não tem um benefício económico claro para a farmácia que esteja “de serviço”, muito pelo contrário. Daí, a existência de um acordo entre as farmácias para que essa obrigação seja cumprida em rotatividade. Ora, se uma farmácia, por sua livre iniciativa, decide disponibilizar um serviço à população, aumentando a acessibilidade ao sistema de saúde (e sem cobrar taxa por isso…), por que razão tal não há-de ser permitido? Por causa de interesses económicos? Como já disse, penso que, em situações de conflito entre questões sanitárias de interesse público e questões económicas de interesse privado, deve ser dada primazia ao primeiro. Por causa da legislação? Sem dúvida, o cumprimento da legislação deve ser escrupulosamente assegurado. Mas a legislação existe para servir e assegurar o interesse da população. Por que não alterá-la, se isso representar um reforço da acessibilidade ao sistema de saúde?

Uma última nota: A alteração da lei no sentido de permitir a abertura, no período das 24 às 6 horas, das farmácias que assim o entendam não poderá, em caso algum, limitar a acessibilidade a farmácias em zonas do país em que não haja interesse de nenhuma farmácia em permanecer aberta 24 horas. Previsivelmente, este será o caso para um elevado número de farmácias que asseguram a cobertura de zonas do território nacional com menor densidade populacional, pelo que é imperativo que qualquer alteração legislativa que venha a ser introduzida preserve o princípio da existência de pelo menos uma farmácia aberta em período nocturno, por zona geográfica.

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